A
BEM-AVENTURANÇA DE QUEM SOFRE POR CRISTO
Mateus 5:10-12
Uma das qualidades mais
destacadas de Jesus era sua absoluta honestidade. Nunca deixou lugar a que os
homens se equivocassem com respeito à sorte que podiam esperar se escolhiam
segui-lo. Sempre deixou claro que "não tinha vindo para tornar fácil a
vida, mas para tornar grandes os homens".
É-nos muito difícil entendermos
os sofrimentos que tiveram que suportar os primeiros cristãos. Em todos os
aspectos de sua vida precisaram suportar incríveis dificuldades.
(1) Sua fé podia ser motivo de
que perdessem seu trabalho.
Imaginemos alguém que fosse
pedreiro. Uma profissão ao que parece inocente. Mas a empresa para a qual
trabalhava o enviasse a levantar as paredes de um templo pagão. Qual devia ser
sua atitude? Ou possivelmente se tratasse de um alfaiate: qual devia ser sua
atitude se lhe encarregavam de confeccionar as vestimentas litúrgicas de um
sacerdote pagão? Em uma situação tal como aquela em que se achavam os primeiros
cristãos, dificilmente haveria algum trabalho no qual não tivessem que
enfrentar vez por outra conflitos entre seus interesses econômicos e sua
lealdade a Jesus Cristo. A Igreja não duvidava de qual era a obrigação de seus
membros.
Quase cem anos depois alguém se aproximou
de Tertuliano para lhe expor este mesmo problema: "O que posso fazer?
Tenho que viver!", disse depois de ter exposto sua situação.
E Tertuliano lhe respondeu:
"Realmente tem que viver?" Se a alternativa era entre ser leal a
Cristo e a vida, o verdadeiro cristão sabia qual era sua obrigação.
(2) Sua fé, é obvio, perturbava
sua vida social. No mundo antigo a maioria das festas eram realizadas no templo
de algum deus. Muito poucos eram os sacrifícios em que os animais se queimavam
totalmente no altar. Em alguns casos somente se ofereciam, de maneira
simbólica, alguns cabelos cortados da cabeça da vítima; parte da carne ficava
para os sacerdotes, a modo de pagamento, e o resto era devolvido ao adorador.
Com esta parte ele oferecia uma festa para seus parentes e amigos. Uma das
divindades mais populares, a que se ofereciam sacrifícios frequentemente, era
Serapis.
E quando se mandava um convite para participar
da festa que seguia inevitavelmente à cerimônia religiosa, a forma do texto
dizia:
"Convido-o a compartilhar comigo a mesa
de nosso Senhor Serapis..."
Podia um cristão participar de
uma festa que se celebrava no templo de uma divindade pagã? Não somente isto,
mas sim qualquer refeição comum, até nas casas particulares, começava sempre
com uma libação, um copo de vinho que se derramava em honra de algum dos
deuses. Era como "dar graças a Deus" antes das refeições. Podia um
cristão participar de tal ato de adoração pagã? A resposta, também neste caso, era
bem clara. O cristão devia separar-se de seus semelhantes em vez de aprovar com
sua presença atos dessa natureza. Para ser cristão era necessário estar
disposto a isolar-se de outros e ficar sozinho.
(3) Pior ainda, o cristão devia,
em alguns casos, aceitar a ruptura de sua vida familiar. Com frequência ocorria
que um dos membros da família se convertia ao cristianismo, enquanto outros
seguiam sendo pagãos. Possivelmente a esposa se tornasse cristã, mas seu marido
não.
Um filho ou uma filha aceitavam a
fé, enquanto seus pais e irmãos permaneciam no paganismo. Imediatamente se
produzia uma divisão na família. Frequentemente a porta do lar se fechava para
sempre na cara daquele membro da família que tinha abraçado a fé cristã. O
cristianismo não contribuía para a união da família, mas sim era como uma
espada que vinha para dividi-la em duas partes. Era literalmente certo que o cristão
devia estar disposto a amar mais a seu Senhor que a pai, mãe, esposa, irmão ou
irmã. Naqueles dias a fé cristã muito frequentemente significava ter que
escolher entre Cristo e os seres mais queridos e próximos do crente. Mais
ainda, as sanções legais das que se fazia passível o cristão eram muito mais
drásticas do que podemos imaginar.
Todo mundo sabe que os cristãos
eram jogados aos leões ou queimados na estaca. Mas estas eram mortes
misericordiosas. Nero envolvia os cristãos em breu e os usava como tochas para
iluminar seus jardins; costurava-os em peles de animais selvagens e lançava aos
cães de caça para que lhes rasgassem a carne a dentadas. Eram torturados no
cavalo de madeira, rasgados com tenazes; vertia-se chumbo derretido sobre seus corpos;
eram-lhes postos pranchas de bronze aquecidas como brasa sobre as partes mais
delicadas do corpo. Era-lhês, arrancados os olhos.
Cortavam-lhes partes do corpo que
eram assadas em sua presença. As mãos e os pés eram queimados, enquanto eram
banhados em água fria, para prolongar a agonia. Não são coisas agradáveis de
mencionar, mas para tudo isto, devia estar preparado aquele que aceitava a fé
cristã.
Podemos nos perguntar por que os
romanos perseguiram o cristianismo. Pareceria extraordinário e incrível que
alguém acreditasse necessário e correto submeter à perseguição e morte aos que
levavam piedosas vidas cristãs.
As principais razões são duas:
(1) Havia rumores caluniosos com
respeito aos cristãos, que circulavam por todo o império, e os judeus eram, em
parte, responsáveis por esta difamação.
(a) Acusava-se os cristãos de canibalismo;
tomavam literalmente as palavras da instituição da Ceia – "Isto é meu
corpo", "Este cálice é a nova aliança no meu sangue" – e corria
a história de que os cristãos em seu culto sacrificavam crianças e as comiam.
(b) Acusava-se os cristãos de práticas
imorais e os rumores enfatizavam que suas reuniões semanais fossem orgias
de desenfreada concupiscência. O culto semanal que celebravam os cristãos era
denominado Ágape, ou seja
"festa de amor", e este
termo era interpretado da maneira mais grosseira possível. Os cristãos se
saudavam entre si com o beijo da paz, e este gesto também servia como base de
tergiversações para os caluniadores da nova fé.
(c) Acusava-se os cristãos de ser
incendiários. É certo que com muita frequência falavam do fim do mundo,
e que revestiam a mensagem de sua fé com as imagens de uma linguagem
apocalíptica, segundo o qual as chamas consumiriam todas as coisas. Os críticos
do cristianismo distorciam esta terminologia, transformando-a na ameaça de uma
incendiária plataforma revolucionária, no sentido político deste termo.
(d) Acusava-se os cristãos de perturbar
as relações familiares. O cristianismo, de fato, produzia divisões nas
famílias, como vimos; por esta razão era representado como uma fé que dividia o
marido da esposa, e transtornava a vida da família. As mentes maliciosas tinham
suficiente material para inventar suas infundadas calúnias.
(2) Mas o principal motivo das
perseguições era de natureza política. Pensemos na situação do Império Romano
que naquela época incluía quase todo mundo conhecido, das ilhas britânicas até
o Eufrates, e desde a Germânia até o norte da África. Como se podia fazer para que
esta enorme amálgama de nações e povos tivesse algum reflexo de unidade
política? Onde se poderia descobrir um princípio unificador? No princípio foi
encontrado no culto da deusa Roma, o espírito tutelar do império. As províncias
do vasto império aceitavam prazerosas esta divindade, porque o governo de Roma
havia lhes trazido a paz e a ordem pública, a legalidade e a justiça. Ficaram
livres de assaltantes as estradase os mares estavam livres de piratas; o
despotismo e a tirania dos soberanos autocratas tinha sido deslocado pela
imparcial justiça romana.
O habitante da província estava
bem disposto a participar da adoração do espírito do império que tanto tinha
feito por ele.
Mas a adoração de Roma avançou um
passo mais. Havia um homem que personificava o Império, um homem que podia
oferecer-se como encarnação de Roma, e este homem era o imperador. Portanto o imperador
chegou a ser considerado um deus, rendendo-se a ele honras dignas de um deus e
construindo-se templos dedicados à sua divindade.
O governo romano não foi o
iniciador deste culto; de fato, no princípio fez todo o possível por
desalentá-lo. O imperador Cláudio disse que desprezava a tributação de honras
divinas a um homem. Mas com o correr do tempo os romanos descobriram que esse
culto do imperador podia servir como princípio unificador do enorme Império
Romano; ali estava o centro comum ao qual todos podiam acudir. Deste modo finalmente
a adoração do imperador deixou de ser voluntária e se tornou obrigatória.
Uma vez por ano todos os varões do
Império deviam ir ante uma imagem de César e queimar um pingo de incenso,
dizendo: "César é o Senhor." E isto, precisamente, era o que os
cristãos se negavam a fazer.
Para eles o Senhor era Jesus
Cristo, e não estavam dispostos a oferecer a nenhum homem o título que
correspondia a Ele.
Pode perceber-se imediatamente
que a adoração de César era mais que nada uma prova de lealdade política. De
fato, quando alguém cumpria o ato de adoração que se descreveu, recebia um
certificado, o libellus, no qual se estabelecia que o possuidor tinha
comprido o seu dever como habitante do Império Romano, e que portanto podia
adorar a qualquer outro deus que quisesse, sempre que seu culto não
interferisse com a ordem pública nem atentasse contra a decência. Os cristãos
se negavam a aceitar esta norma. Confrontados pela alternativa de escolher entre
Deus ou César, sem vacilar preferiam seguir a Cristo. Negavam-se a entrar em
acordos de qualquer espécie. O resultado era que por melhor pessoa e melhor
cidadão que fosse, o cristão ficava, automaticamente, fora da lei. O vasto
Império Romano não podia permitir-se alojar redutos de deslealdade, e isso era
precisamente o que significava cada congregação cristã, segundo o ponto de
vista das autoridades.
Um poeta se referiu a: "O rebanho
temeroso e angustiado cujo crime era Cristo."
O único crime dos cristãos era
colocar a Cristo acima de César; e por esta lealdade suprema os cristãos
morreram aos milhares e enfrentaram incríveis torturas.
0 Comentários:
Postar um comentário